terça-feira, 23 de agosto de 2016

A Lei Moral Kantiana

“Ponhamos, por exemplo, a questão seguinte: - Não posso eu, quando me encontro em apuros, fazer uma promessa com a intenção de a não cumprir? […] - Ficaria eu satisfeito de ver a minha máxima (de me tirar de apuros por meio de uma promessa não verdadeira) tomar o valor de lei universal (tanto para mim como para os outros)? E poderia eu dizer a mim mesmo: - Toda a gente pode fazer uma promessa mentirosa quando se acha numa dificuldade de que não pode sair de outra maneira? Em breve reconheço que posso em verdade querer a mentira, mas que não posso querer uma lei universal de mentir; pois, segundo uma tal lei, não poderia propriamente haver já promessa alguma, porque seria inútil afirmar a minha vontade relativamente às minhas futuras acções a pessoas que não acreditariam na minha afirmação, ou, se precipitadamente o fizessem, me pagariam na mesma moeda. Por conseguinte a minha máxima, uma vez arvorada em lei universal, destruir-se-ia a si mesma necessariamente. Não preciso pois de perspicácia de muito largo alcance para saber o que hei de fazer para que o meu querer seja moralmente bom. Inexperiente a respeito do curso das coisas do mundo, incapaz de prevenção em face dos acontecimentos que nele se venham a dar, basta que eu pergunte a mim mesmo: - Podes tu querer também que a tua máxima se converta em lei universal? Se não podes, então deves rejeitá-la, e não por causa de qualquer prejuízo que dela pudesse resultar para ti ou para os outros, mas porque ela não pode caber como princípio numa possível legislação universal. […] Assim, no conhecimento moral da razão humana vulgar, chegámos nós a alcançar o seu princípio, princípio esse que a razão vulgar em verdade não concebe abstractamente numa forma geral, mas que mantém sempre realmente diante dos olhos e de que se serve como padrão dos seus juízos. Seria fácil mostrar aqui como ela, com esta bússola na mão, sabe perfeitamente distinguir, em todos os casos que se apresentem, o que é bom e o que é mau […]” 
I. Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes, Lisboa, Edições 70 pp. 35-36

Sem comentários: